Um piercing no olho
Eu tinha um piercing no olho.* Não na sobrancelha, no cantinho que se costuma perfurar para colocar o piercing. Eu tinha um piercing no olho. No olho mesmo, na parte da esclera, perto da íris. Para tirá-lo, era preciso fazer um movimento giratório, de rosquear, porque seu formato era o de um saca-rolha. Se eu puxasse a peça de uma vez, o olho explodiria, eu teria um olhar rasgado.
É claro que isso foi um sonho. Há alguns dias sonhei que tirava esse piercing como se salvasse uma rolha: com cuidado para que nada desse errado. Sem pressa, sem violência, sem desespero. Mas o sonho parou por aí, eu não sei por que tinha um piercing no olho. Acordei pensando nisso. E quando não contamos os sonhos na análise, eles viram texto.
Depois fiquei pensando na estranheza do sonho, porque além de ser eu a ter o piercing, eu também me via, como se eu fosse duas pessoas. Eu não sabia se o Alex-observador também tinha o piercing, mas era certo que nós (meu duplo e eu) estávamos incomodados com ele. E a esclera era de um branco tão bonito, leitoso, do que tipo em que dá vontade de afundar uma colher para ver se é manjar.
Não acordei como um inseto monstruoso, mas os sonhos intranquilos estavam lá quando abri os olhos. Havia algo mais além do piercing, além do olho, da espiral metálica úmida, da sensação de calma no movimento de retirar o piercing. Havia ângulos estranhos, cortes variados como se tudo fosse uma lente, um filme. E talvez fosse.
Acho que nunca comentei isso por escrito, mas muitos dos meus sonhos têm mais de um ponto de vista, como se eu flutuasse pelas pessoas presentes — quando não sou eu mesmo as pessoas presentes. Penso que talvez houvesse um terceiro Alex assistindo a tudo isso, editando o que nós três víamos. É isso, eu era um trio. Num sonho em que talvez as garrafas de vinho fossem abertas com colírios.
*Eu realmente tive um piercing, mas na sobrancelha esquerda, quando tinha 16 anos. Foi meu hóspede por um ano e meio.
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Adorei!!! Sonhos me fascinam.
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